@antonio
Semanas depois de ler o livro e rever o filme, entendi porque o final me arrasa tanto. Há uma camada psicológica menos óbvia.
As crianças do internato não têm mãe nem pai, mas as professoras acabam sendo mães não apenas simbólicas, são os únicos modelos adultos com quem têm contato e também as responsáveis pela educação e bem-estar delas; ou seja, na prática são as mães que têm. Dividem-se em vários modelos: a mãe amorosa (que todo mundo compete para receber afeto), a mãe que é autoridade severa (a diretora), a mãe subversiva que se revolta contra o sistema, a mãe de poder misterioso (a Madame).
No final, quando Kathy e Tommy vão pedir ajuda da Madame e da diretora para poderem viver alguns anos a mais juntos, a diretora não apenas conta toda a brutal verdade, mas basicamente se isenta de qualquer culpa (mostrando-se mais preocupada com a mudança de um móvel do que com o casal), algo como: “Não sou uma pessoa má, eu fiz o que pude, o que estava ao meu alcance, estava tentando ajudar. Mas vocês que se virem agora. Desculpem, mas o mundo é um lugar cruel.”
O casal entende e até aceita. Afinal, é uma “mãe” deles. Mas do seu ponto de vista, Kathy e Tommy não têm como deixar de se sentirem imensamente prejudicados, por pessoas que em tese estavam encarregadas de protegê-las.
Essa dinâmica é bastante similar ao que vemos entre mães, pais e crianças, que depois de se tornarem adultas, podem terminar traumatizadas por problemas na criação. Não há como culpar verdadeiramente os adultos, na maioria dos casos. Estão tão imersos em um sistema perverso como todo mundo. Mesmo assim, o trauma pode permanecer, com muitas consequências.